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A jornada de uma "criativa bloqueada" em busca da libertação

Foto do escritor: Ilana MajerowiczIlana Majerowicz

Atualizado: 28 de mai. de 2020



Como boa virginiana que sou sempre tive um monstro vivendo dentro de mim corroendo minhas víceras criativas com sua autocrítica exacerbada e sua perfeição idealista. Ao longo da faculdade de Design Gráfico eu via os sintomas desse monstro aparecendo. No início a faculdade tava legal, parecia que eu estava no lugar certo, até começarem as competições entre os alunos nas aulas de projeto, as comparações nas aulas de desenho, alguns professores até faziam votação de melhor projeto criando verdadeiras rixas entre os estudantes. Essas vivências me faziam acessar um sentimento de desvalor e insuficiência que vinha lá da infância e que me deixava bem insegura.


Assim, fui perdendo cada vez mais a minha conexão com o meu processo criativo e fui ficando expert em entender os padrões que um bom design deveria ter para trabalhar dentro de um lugar "seguro", que seria aceito pelo professor/chefe/cliente. Não que conhecer esses padrões seja algo ruim, essa é uma base importante, porém esse conhecimento virou uma muleta para que eu não entrasse no risco da criação (não ser aceita, não agradar, falhar) e preferi me adequar às regras e modismos. Buscava ideais de perfeição que se baseavam no que o outro fazia, ou o que o "designer master blaster" fazia e não mais o que saia de minhas próprias mãos.


Falei mãos, mas cada vez menos eu fazia coisas manuais para dar lugar ao computador e softwares de edição gráfica. Os softwares são ferramentas valiosas, mas eles me limitaram a sua perfeição, ao ponto que eu não conseguia mais dar valor ao que tinha um toque manual, fui perdendo o gosto por desenhar, esboçar, pintar e tudo foi ficando bem encaixotado pra mim.


Eu vivia num looping que era assim:

1. Empolgação inicial com o projeto > 2. Idealização de um resultado e criação de expectativas > 3. Medo de não chegar no ideal (falhar, errar) > 4. Paralisia > 5. Procrastinação (várias distrações e culpa ao mesmo tempo) > 6. Pressão e ansiedade para fazer tudo na última hora > 7. Autoflagelo por deixar pro último dia > 8. Não me sentir realizada e satisfeita com o resultado

Eu somatizava criando muitas dores no pescoço, nos ombros, na lombar, dores de cabeças e chegava a ter torcicolo. Sentia muita raiva de mim, das pessoas e do mundo! Isso tudo me levou à terapia, quando eu empaquei no TCC e estava quase entrando em depressão. Minha vida já tava ficando sem sentido, quando eu decidi conhecer outras coisas. Eu me lembro de um colega da faculdade dizendo: "- vai fazer um curso sobre minhocas". E foi quase isso que fiz. hehe. A primeira coisa que encontrei foi o Dragon Dreaming e foi um sopro de esperança se abrindo. Me reconectou com meus sonhos, me fez entender a natureza dos processos e métodos de projeto conectados a um fluxo natural e orgânico, me trouxe mais clareza sobre esses monstros internos e fui me descobrindo facilitadora.


Depois de tanto sofrer com a pressão interna que eu vivia, eu decidi soltar a carreira de designer gráfico e abrir outras frentes. Assim como a água que busca fluir pelo caminho de menor resistência. Mergulhei no design para sustentabilidade, criando projetos para a "transição" e também na facilitação para apoiar o desenvolvimento desses projetos. Me sentia mais conectada ao meu propósito mas algo ficava dentro de mim incompleto, como se eu tivesse que escolher dois caminhos diferentes: ou você trabalha no campo social, desenvolvimento humano ou você trabalha no campo artístico e da comunicação visual. A prática me mostrou que eu precisava dos caminhos juntos para me sentir inteira.


Então, no ano passado eu decidi olhar para os monstros que ficavam ali escondidos dentro de mim e percebi que se eu não os encarasse eu não conseguiria resgatar a minha conexão com a fonte criativa.

Descobri o livro da Julia Cameron - O Caminho do Artista, e super me identifiquei nas crenças que levam os artistas ao bloqueio criativo. Me joguei em vários processos e jornadas para reativar o fazer à mão, mexer com linhas, tintas, desenhos, criação de poesias, cordéis, palhaçaria... A vida foi ganhando cor novamente! (foi assim que surgiu esse site...)


Tive que ir reconhecendo e acolhendo cada um dos monstros que me aparecia, as vezes eles vinham à noite me assombrar e tinha muita insônia. Agora, com mais ferramentas e maior amadurecimento emocional era possível entrar nesse processo. O trabalho como facilitadora me trouxe um despertar espiritual, uma conexão com algo que está além do visível, me trazendo outra qualidade de escuta para as pessoas. E aí, quando facilitação gráfica chegou na minha vida eu senti as coisas se encaixando, se reintegrando, uma possibilidade de exercer os dons que tenho com a visão de mundo que busco viver e compartilhar.


Voltei a desenhar, a lidar com o erro, com traço mal feito, a imperfeição das mãos, a reconhecer o que sai de mim como belo, do jeito que ele sai e se expressa, de deixar que o tempo faça o traço evoluir, pra onde eu nem sei, sem parâmetros ou expectativas, mas referências e inspirações são bem-vindas, sem comparações, descobrindo o que é singular no meu jeito de fazer, deixando ser leve e prazeroso. Apreciando e curtindo o processo, mais do que buscando por um resultado específico.

Hoje eu olho para trás e vejo que os caminhos não foram diferentes, mas é que um precisava do outro para existir, não daria para ser uma designer totalmente desconectada e adoecida, me anestesiando com remédios (eu vivia à base de dorflex), bebida e distrações, assim como não daria para ser facilitadora abandonando aquilo que é inato em mim. Fui construindo um caminho possível para ir me reintegrando, me reconhecendo, me escutando... e entendo que isso tudo foi permeado também pela busca de curar o feminino interno, de recuperar aspectos da mulher selvagem sufocados pela voz do superego patriarcal. (mas isso eu aprofundo em outro texto hehe)


Vejo que isso tudo veio de uma vontade de viver de verdade e transbordar o que vivo, para que mais pessoas possam viver suas verdades também.

Não acho que estou curada dos monstros do "bloqueio criativo", mas encará-los foi o primeiro passo para entrar em fluxo e ir percebendo seus gatilhos, desenvolvendo formas criativas de driblá-los, conhecendo novos métodos e ir ficando íntima deles para que deixem de me assombrar e possam ser parceiros nessa jornada. Reconheço que eles me levaram a lugares que nunca imaginei que eu poderia ir e me interessar. Os bloqueios se tornaram faróis que mostram onde estão minhas potências reprimidas. Agora eles têm me jogado para o corpo, para acessá-lo em sua expressão criativa e espontânea, para sua capacidade de revelação do invisível e aqui mergulho em mais uma camada de mim mesma.


Ilana Majerowicz

26.05.2020

 
 
 

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